segunda-feira, 21 de setembro de 2015

O baptismo do meu avô

Em 1943 o meu avô tinha 25 anos, uma bicicleta e estava apaixonado.
A pretendida era de boas e burguesas familias de Benavente, comerciando diretamente com o Alfredo da Silva. E se apesar de o meu avô ser um paupérrimo carpinteiro, tal não viria a ser impedimento irremediável, um outro maior assombrava o casório: o meu avô era filho de um anarquista do Lavradio,  e como tal não era batizado.
Ora se queria casar, teria que ser na igreja católica com pompa,circunstancia, padre, missa e tudo. E para isso tinha que ser batizado, não havia volta a dar.
Ora então, a custo e contravontade lá pedalou até ao Barreiro a fim de pedir as bençãos ao Pároco, que nessa altura era não menos que um tal de Abílio Mendes.
Com a sua roupa domingueira lá chegou às falas com o padre que lhe pediu o nome
- Etelvino Vaz Atalaia
- do Lavradio? pede então o padre confirmação...
- Pois que sim.
- Filho do José que andou em 1910 a atirar os santos ao mar?
A coisa estava feia, mas o meu avô lá se desenfiou, alegando não ser nascido à data...
O filho do anarquista queria ser católico e isso não havia de trazer mal, deve ter pensado o Padre, pelo que he entregou um catecismo para que o estudasse nas duas semanas seguintes.
O meu avô lá terá passado os olhos pelo livrito e quinze dias depois apresentou-se de novo.
- Leste tudo?
- Sim.
- E sabes o que aí diz?
- Sim.
- E trazes dinheiro?
- Trago pouco, mas é o que tenho, disse o meu avô cujo parco ordenado servia para suportar as contas de casa, onde vivia com os pais.
- Ora dá cá o que tens - e pegando no dinheiro entregou de troco um papelucho ao meu avô: - toma lá o assento que já estás batizado.

E assim pode o meu avou casar com a minha avó, um par de meses depois na Igreja dos Anjos em Lisboa, com pompa, circuinstância, padre, missa, limosine e patrocínio do sogro.






1 comentário:

  1. Por acaso encontrei esta publicação que li até final primeiro por falar em Lavradio,eu sou do BARREIRO, em segundo lugar por falar em Anarquista e vem mesmo a calhar para relatar que quando foi feito o chamado Bairro Novo da Cuf por volta de 1955 o meu sogro de nome Belmore Cação que vivia numa casita num pátio do Bairro das Palmeiras e como trabalhava na Cuf (tecidos) candidatou-se a uma casa no referido Bairro. Como comunistas, ele e a minha sogra não eram casados pela igreja mas como viam a possibilidade de poderem dár melhores condições de vida à sua filha e só podiam concorrer casados pela igreja, lá foram também casar em cerimónia religiosa com a filha já com 9 anos e penso que pelo mesmo Abilio Mendes para poder trocar a "barraca" no Pátio com 1 Hall, 1 quarto s/ casa de banho por um 4º andar do "Bloco Alferrarede". Tempos dificeis

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